A certeza mora no vazio

A certeza mora no vazio

Para ler ao som de

 

Eu não tenho certeza. Nenhumazinha que seja só minha.

Não sei se as escolhas que fiz foram as melhores, não sei se as que farei me levarão pra onde seja legal. Não sei se onde quero chegar tem um preço que estou disposta a pagar, tampouco se daqui 20 anos vou achar que o que escolhi foi o melhor. Eu tenho apenas apontamentos. Escolhas baseadas no que acho que é o melhor, que daqui um mês, sob outro prisma, eu posso achar que era pior. E nessas certezas sempre incertas, sinto a vida como um tropeço, uma respiração entrecortada entre um acontecimento e outro. Sem tempo. Com pressa e ainda assim, arrastada.

Eu sinto a vida como um sopro com peso de um soco, com ansiedade de quem quer nascer mas não quer desocupar o lar. Eu tenho pressa das respostas e quando as vivo, sinto falta das perguntas. Eu corro pra atravessar fases pra logo em seguida sentir falta dos inícios. Eu tenho um ninho de borboletas no estômago que vivem em tensão pelo sopro do vôo. Eu procuro endorfinas para liberá-las sozinha, mas tontas e dependentes que são, parecem não se lembrar da posse das próprias asas e se permitem atrofiar.

Do amor eu conheço apenas a primeira fase que nos contaram. Afinal, o que é o amor após o primeiro beijo, o primeiro frio na barriga, a primeira mão na nuca? Não nos preparam para o meio e nos contemplo atravessando da euforia inicial para a depressão dos finais. O que fazer, como agir quando o amor deixa de ser bebê e se torna adulto? Que comida dar para que o tédio e o saudosismo individualista não nos engula e nos faça achar o próximo galho, com as mesmas repetidas sensações iniciais, mais interessante? Por que ainda não aprendemos lidar com meios e fins e apenas suspiramos pelos inícios?

Onde se esconde o pote do tesouro da rotina, da beleza de um sol que nasce todos os dias e por esse mesmo motivo milagroso, deixa de encantar para irritar? Onde estão as sombras do caminho, os oásis que nos permitem o tempo do suspiro para não deixar o encanto escapar entre os dedos? E em qual bagagem se leva a insatisfação consigo, com a vida sem ter também acoplado a culpa por se sentir assim? Aliás, somos um amontoado de culpa. Se sentimos vontade e temos motivos para reclamarmos, nos culpamos porque há tantos que têm menos. Se a vida se torna um tédio rotineiro, nos sentimos culpados por termos perdido, em algum momento, a capacidade de nos encantarmos com o cenário repetido. E digo: tudo isso é tão legítimo, tanto a culpa quanto os outros sentimentos, que as vezes acredito que o paraíso, o oásis esperado se encontra na aceitação, no abraço de todos os sentimentos. No lamento de quem perdeu e chora porque perdeu, na ânsia do que quer e não nota o que tem e se culpa por não notar. Todas essas coisas estão dentro da lei, da lei que rege em cada universo que é todo ser humano. E sinto tanto essa legitimidade abortada que talvez aí, bem nesse detalhe, surja em mim alguma certeza: Precisamos de mais tempo para respirar, para assimilar e absorver a vida. De não sermos atropelados entre um acontecimento e outro, entre uma noite mal dormida, uma doença, uma decepção e as obrigações da manhã.

Talvez, de vez em quando, apenas um dia para chorarmos mágoas ou para apenas sentarmos e observarmos fosse o suficiente para o fôlego e o brilho nos olhos, voltar. Mas a vida, a vida não espera e o tempo, não pára.