O imperfeito

O imperfeito


Quando eu o olhava, sentia o céu brilhar. Acontecia uma explosão de cores felizes em mim que começava no céu da boca e ia descendo pela corrente sanguínea, até tomar meu corpo todo. Era uma felicidade extrema, exorbitante, gritante. E depois, a mesma onda que havia me feito pisar nas nuvens, me fazia pisar na brasa, no fogo ardente, em espinho, e em sei lá o que, em toda e qualquer coisa que doesse.
Ele era perfeitamente imperfeito. Sem nada no lugar, tão desequilibrado quanto eu. Um apaixonado pela vida, meio romântico, meio cínico, meio feliz, meio mal humorado. E eu era a romântica meio sem assumir, a meio louca pendendo pro totalmente, a meio qualquer coisa e tudo ao mesmo tempo.
Ele era doentiamente escorregadio. Meu Deus, como eu odiava segurá-lo e logo depois ele ficar lá, dançando aquela dança meio macarena na minha frente, meio botando a língua pra fora, num desaforado: “Tô aqui fora de novo, lá,lá”.
Mas, ele era também uma almofada fofa de pelúcia. Um sonho bom de noite chuvosa. Uma tarde bonita em alguma praia de Floripa, a euforia do FICA, a sensualidade dos meus sonhos inacabados, a temperatura quente dos meus desejos. Ele era um misto de tudo. E quando eu começava cair de amores, suspirando, lá vinha ele com sua mania de fazer meu coração bater no estômago, dando passos descompassados dos meus. E quando eu estava prestes a cansar, ele se virava, sorria, pegava no meu rosto, e era fatal, eu já não me lembraria de mais nada das suas rebeldias.
Ele era o sonho mais real que eu já havia tido. E o meu chão mais áspero também. Perfeito, porque era exatamente assim, imperfeito. Muito imperfeito.
E acho que foi isso que me levou tatuá-lo no braço, no peito, na virilha, na boca, e no coração.
Ele era a encarnação das minhas mais doces e malucas ilusões. Era eu num corpo estranho.
Graças a ele hoje eu sei que a felicidade não está nas coisas mais concisas, nem nas mais perfeitas, muito menos nas realidades mais palpáveis. Hoje eu sei que a felicidade mora aqui dentro, no peito, e as vezes é exatamente a imperfeição de algum momento ou pessoa que a faz acordar.
Camila Lourenço