Amor,
Te escrevo em miudinho porque há em mim tanto excesso que há que se transbordar. Precisava eu da gota d’água no copo cheio pra poder vomitar o que não me cabe, que me entope as veias e me impede de respirar e leva minha fé pra longe de ti.
Amor, são tantos encontros desencontrados, e tanto engano nas certezas pequenas de segundos, que minha razão já não sabe se nossos passos vão cruzar o mesmo caminho.
É tanta gente com a mesma prece na boca quando o cabelo desfila no travesseiro, que me pergunto porque seria eu privilegiada e te encontrar enquanto meus olhos ainda fitam o céu com esperança bonita.
Eu deixei meu melhor na última esquina. E era só uma esquina. Eu sangrei meu peito no último encontro. E era só mais um encontro. Eu soprei te amo pro meu último reflexo. E era meu reflexo. E ele sorriu. E eu acreditei que isso bastasse pra preencher o vazio do só. E não bastou.
Eu fui sincera a cada despedida, e beijei com os olhos fechados de quem valoriza cada dançar de lábios.
Eu não joguei pérola aos porcos, não jurei mentira, não andei abraçada à miserável indiferença. E mesmo assim, o meu peito deitou na lama pra te encontrar no nada mais uma vez.
Eu me doí inteirinha a cada pedaço que fui inteira. E me prometi quarenta vezes ser menos que o começo. Menos que os olhos que zanzeiam no primeiro encontro de pupilas de bar.
Mas eu não fui. Eu dei o meu maior volume de risada pra cada motivo, e abraços apertados pra cada encontro. Eu fui eu todinha. T o d i n h a. Sem nem ter encontrado a paixão. Fui só o vulcão que um dia você vai encontrar e saber que é rotineiro.
Eu fui. E não valeu. E já não sei mais de você. Se nosso encontro vai se valer ou nessa vida acontecer.
Você vai me encontrar mais dura do que o que você merece, menos disponível do que julgava, e o tamanho da nossa distância provavelmente será maior que a minha fé em sua existência.
Você vai me encontrar rindo desbocada de um seriado que descobri sozinha, ou na mesa do bar com as amigas que fiz sozinha, e em meio ao meu hino de “não preciso de você”, você vai ler “achei que você não viria mais”.
Amor, acaso existas e se fores melhor e maior que meu último chopp, envia-me um bilhete marcando nosso encontro casual. Frente a um prédio besta, num meio fio descascado, rindo da vida tonta, que de tão tonta nos põe a dançar sozinhos mesmo com nossos pés procurando par. Me sopra no vento a cor do avental da tua janta, e passe batom na minha cara só pra não esquecermos que a gente é só criança, e nosso encontro é só pra fazer um ao outro sorrir. Te lembra, me lembra, grita ao mundo: Foi pra isso que viemos aqui.