Nove anos após a 2º guerra mundial, numa cidadezinha do interior de Goiás, que nem sequer era registrada como município, uma jovem desembarcou de mudança. Havia perdido a mãe quando criança e tido uma dificuldade enorme em se adaptar ao novo lar que o pai constituíra. Acabara de completar 16 anos e resolveu arriscar uma nova fase na vida, indo viver com a avó no interior do interior de Goiás.
No dia de sua chegada, ainda descendo a mudança, sentiu que alguém a observava de longe. Olhou. Era um jovem e simpático rapaz. Ela sorriu por dentro e continuou descer suas coisas, que eram poucas, com um sorriso bobo no rosto daqueles de quem tem esperança numa nova vida. Depois de instalada, logo fez amizade na pequenina cidade. Era bonita, risonha e não havia tantos habitantes assim para que fosse difícil qualquer amizade frutificar. Lembrou-se daquele jovem rapaz que a olhara e passou saber sobre. Descobriu que o jovem era namorador, não firmava com ninguém mas que era de boa índole, apesar da mania de colecionar namoradas. Respirou fundo, deixou pra lá. Os rapazes da sua nova terra logo a notaram e começaram os cortejos. Já estava até pensando em ceder a um e engatar num namoro, quando chega em casa um dia e dá de cara com ele, o “rapaz da mudança”. Sentiu as pernas bambas. Sorriu, cumprimentou e foi pro interior da casa, já que não podia ficar sozinha na sala com um homem. Encontrou sua tia, alguns anos mais velha, comentando sobre o rapaz que estava na sala, não prestou muita atenção, aliás, sequer conseguia pensar direito. A cabeça estava um turbilhão. Quando todos estavam na sala, voltou, trocou alguma conversa com o jovem e logo depois ele se foi. Poucos dias após a visita, encontrou o jovem na pracinha da cidade e os dois engataram numa conversa. O jovem era simples, tinha em comum com Jesus a profissão (era carpinteiro), tinha vários irmãos, sorria fácil. Lhe contou das suas histórias de infância, sobre como os irmãos haviam milagrosamente não sido selecionados para a guerra. Contou da sua visão do mundo. Em determinado ponto da conversa o assunto descambou sobre namoros e ela comentou com ele sua fama de garanhão. Ele sorriu, disse que talvez não tivesse encontrado a certa ainda, e ela: “Então, que tal tentarmos?” Ele a olhou espantado. Era pleno 1954 e ele não conhecia uma mulher sequer que havia chamado algum homem para namorar. Olhou-a novamente, com aquele cabelo preto voando ao vento, aquele sorriso frouxo no rosto, e aquele olhar fixo encarando o seu. Era linda. Pensou: “Porque não? Ao menos coragem ela tem!” Engataram um namoro que durou um ano.
Ele implicou com o jeito dela andar e ela com o seu pigarro, ele aprendeu ouvir música calma e ela a suportar moda de viola. Ela aprendeu gostar de política e ele começou entender de retalhos. O “colecionador de namoradas” agora tinha olhos só pra uma e em 1955 a pediu em casamento. Dia 01 de junho de 1955 o casal selou o namoro às avessas e começaram uma história que completa esse ano 57 anos.
Do pedido de namoro da moça corajosa surgiram 10 filhos, 23 netos e 17 bisnetos.
A mulher de coragem se chama Maria Divina Lourenço e o melhor homem do mundo (pra mim) se chama Eliel José Lourenço e são meus avós, os dois seres que me ensinaram que amor existe e que dá certo quando aprendemos nos respeitar, e aceitar que ninguém é perfeito.
Porque o senhor e a senhora acham que o casamento de vocês duraram, vó e vô? (eu pra eles)
Minha vó: Porque a gente aprendeu tolerar e respeitar um ao outro.
Meu avô: Porque a gente casou pra VIVERMOS juntos. Na “bondade e na ruindade“.
“O amor não é uma guerra,
mas é algo pelo qual vale a pena lutar.”
Warren Barfield
“Somos da época que se uma coisa estraga a gente não joga fora. A gente conserta.”
Warren Barfield – Love Is Not A Fight
Camila Lourenço
No dia dos avós, não tinha como não republicar a história dos meus heróis.
26 de julho – dia dos avós.